sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Irmãos e duplos

O livro "O Deus das Pequenas Coisas", que traz a história de dois irmãos gêmeos bivitelinos foi comparado por uma amiga com "Dois Irmãos", do Miltom Hatoum. Fui conferir e entendi o comentário. O estilo de narrativa é bem parecido não seguindo uma linearidade de textos e uma forma de narrar com uma delicadeza marcante. Por outro lado, a história amazônica me lembrou muito uma outra obra, "Esaú e Jacó", de Machado de Assis.
Os dois livros tratam de gêmeos univitelinos, idênticos, que carregam uma rivalidade nociva pra eles e todos a sua volta pela vida inteira. Em Miltom, Yaqub e Omar são criados em uma Manaus de mudanças convivendo com a herança da cultura libanesa e o ódio mútuo. Machado nos dá Pedro e Paulo, que já começam a brigar dentro do útero da mãe. A narrativa é muito diferente, como disse, a do Miltom lembra mais Arundhati Roy enquanto Machado... bem, Machado é Machado, né?

Os paralelos são claros: a briga velada e depois declarada dos gêmeos, a disputa pela mesma mulher, as personalidades opostas dos irmaõs e seu desejo de se diferenciar do outro. Até o pedido final que as mães fazem no leito de morte pela paz entre os filhos remete uma história a outra. Sem dúvidas, os dois são ótimos. O do Miltom foi uma surpresa ótima neste ano. Eu já conhecia as crônicas dele, nunca tinha lido romance.

De toda forma, o uso do duplo na literatura sempre volta. Um exemplo fantástivo é o "O Homem Duplicado", de José Saramago. O professor de história Tertuliano Máximo Afonso está tranquilamente assistindo a um filme quando vê um figurante idêntico a ele. Igual. Um duplo! O livro conta a busca do professor por seu duplo, um ator, e o resultado dela. Para quem ainda prefere os clássicos mais antigos, "Retrato de Dorian Grey" sempre será uma obra marcada pela duplicidade, e uma obra séria do maravilhoso e escrachado Oscar Wilde.

E sempre há a primeira das brigas entre os irmãos: Caim e Abel abrem as narrativas bíblicas que depois ainda têm os filhos gêmeos de Isaque e Rebeca, Esaú e Jacó (inspiração para Machado). Rebeca trama com o mais novo roubar o direito de herança do outro filho, depois os dois fazem as pazes e vão servir a Deus. A Bíblia também conta que os irmaõs de José do Egito venderam o rapaz como escravo por ciúme, já pensou? Ainda bem que eu me dou bem com a minha não gêmea irmã. A imagem que ilustra esse post é "A Reconciliação de Jacó e Esaú", de Sir Peter Paul Rubens.

Um comentário:

Anônimo disse...

Oi Gena,
é interessante observar que este tema é também muito explorado pelos autores de novelas. Na maioria das vezes os papéis foram entregues a excelentes atores como Toni Ramos, Eva Vilma, Glória Pires... Como nos livros citados repete-se nas novelas a luta bem x mal. Espera-se que, nestes casos, a arte não imite a vida.
Eleni